O
CTRL C CTRL V DE DIEGO PANSANI
[Foto de Raphaela Fonseca]
Para
Diana Junkes
Notas
rasuradas
com
o carimbo
Lula
Livre
não
perdem
o seu valor,
informa
o Banco Central.
Desde
o começo da semana,
tem
circulado na internet um vídeo
que
mostra um grupo de pessoas
carimbando
cédulas
do
real com uma marca que leva
o
rosto do presidente Lula e
a
legenda “Lula Livre”.
“É
de graça”, afirma a mulher que carimba as notas enquanto apoiadores fazem fila.
Escolho o texto “Valor de uso” (decalque de uma reportagem de 2018), porque é exemplar daquilo que o livro faz e das questões que estão por trás dos procedimentos que o poeta utiliza. Dá pra dizer que a transformação do “valor de troca” em “valor de uso” (de acordo com a terminologia marxista) é o desafio que esse tipo de poesia se coloca: retomar a energia do “valor diferencial” (como se diz em Linguística) para colocá-la a serviço de um valor de “experiência”. Não é nada simples, mas é uma situação que atravessa o livro nas várias situações de comunicação que ele mobiliza, em geral ironicamente, do jornalismo político à linguagem privada ou aos emoticons.
Se a linguagem corrente é um valor “de troca”, é dinheiro (currency), de certo modo, a poesia é concebida como carimbo sobre essa linguagem cotidiana da informação. E sua aposta é a de que esse carimbo se transforme em arma política. Mas uma arma política cuja condição contraditória é a de permanecer sendo poesia. Tarefa complexa que o livro consegue tornar inteligível com muita inventividade, com um jogo eficaz (por exemplo) na escolha dos títulos e na perturbação paródica das estruturas do livro.
Após percorrer as mais de 150 páginas, resta entretanto uma dúvida: quando a poesia entra no jogo diferencial das linguagens, da “diversidade” de linguagens, ela ainda é capaz de propor uma situação alternativa? A radicalização do valor diferencial (ou seja, a relativização ou a abolição total das fronteiras) empreendida pela antipoesia de Pansani pressupõe uma cumplicidade com as fronteiras. Como lidar com isso? É um desafio que se coloca à poesia do readymade, da performance, do processo. Como conjugar o impacto (subversivo) da experiência com os hábitos que esse gesto pressupõe e recoloca em circulação? A poesia teria capacidade de produzir distanciamento, mergulhada no império da informação? Qual seria seu “poder de fogo”?
[Sobre
Nenhuma poesia, de Diego Pansani (Rio de Janeiro: 7Letras, 2019). Texto
originalmente publicado na seção “Porque hoje é sábado” da revista 451, no
Facebook: https://www.facebook.com/revistaquatrocincoum/photos/a.1901817230086276/2547421502192509/?type=3&theater ]